5.3.08

Diálogo a um

Diálogo a um
- Eu sou o canto. cada vez que morres
Eu nasço. Tu vives. Eu vivo sobre.

Eu não sou porto mar
Alto sou, alto
Como a altura de um grito.

O rio que eu fui secou-se nesta rua
Sem mais cor ou saída.

Tu és o suicida dos teus próprios braços,
O morto sem epitáfio,
Eu túmulo e te abrigo.

- Sou o Poeta. O que jaz, sendo vivo.

Bem que eu te sinto, ó tu que apenas moves
Entre a garganta e a língua quando o outono
Com meus olhos escorre.

- Sou o Poeta digo o que não morre.
Morto
Enterrai-me no meu corpo.

Augusto de Campos. In: VIVA VAIA. Série: O rei menos o reino.



A primeira série do livro VIVA VAIA, de Augusto de Campos, O rei menos o Reino, me reporta a um ambiente outonal, onde movimentam-se personagens e vozes mortas-vivas. Ecos de cantos passados .
Nascimento que pós aparece à morte. Movimentos suspensos


no ar, de espíritos ainda em luta com seus corpos confinados , sob a areia.
Elemento PEDRA( duro) prepondera. O sentimento AnGÚSTia.
A cor- alva mais que a neve
vermelha: sangue que escorre ainda da boca
Vento e areia + dois elementos. Solidão infinita dos que já não aparecem aos vivos, mais o ódio e o rancor.
O belo do vento e dos rios e da palavra TERRA que envolve tudo o que é vivo e encobre tudo o que é morto.
personagens enevoados, desconhecidos ou, mais apropriadamente, incognoscíveis- Não os podemos conhecer, posto que fazem parte do lado de lá , do qual os vivos só vislumbram as sombras. Os vivos que velam, que surpreendidos não querem o apodrecer da matéria.
fazer -se em pedra o que se decompõe. A pedra que é lápide, o tum tum da madeira do túmulum. . . Tudo aquilo que da morte é vida porque tudo é infinito e o que é matéria se faz-refaz-desfaz-refaz-faz-desfaz ad infinitum. Porque tudo que é vida é morte que sangra dia após dia.
Texto de Renálide Carvalho.

1 comentário:

Priscila Lopes disse...

Esse poema mata-a-pau!

Excelente o blog, tudo.

Apareça no Cinco Espinhos.